Tempos de violência
A violência é multissecular. A cada ano que passa o ser humano parece estar mais tenso, intolerante e proporcionalmente mais violento. Antes, os homens criavam as suas diversas guerras e em nome do patriotismo ou dos brasões de seus reinos e religiões, se destruíam em constantes e sangrentos combates.
Veraz, que hoje as guerras são menos frequentes e de menor duração em decorrência do avanço tecnológico da macabra e nefanda indústria bélica mundial. Mas, a contextura do instinto perverso e cruel do gênero humano, alastra-se em maquinações capciosas e persistentes em negação ao bem agir e sentir, só que agora, mais burilado e individualizado, no entanto, não menos bárbaro e doentio.
A pessoa sai de casa e nunca tem a certeza se irá retornar. Hoje, não tememos mais só os bandidos, pois também, o homem comum e integrado socialmente, assassina e agride por qualquer futilidade, e quando ele próprio não mata garantido na impunidade quase generalizada, paga a um pistoleiro para matar e fazer “justiça” em seu lugar. A morte de um cara comum como eu, pode ser contratada por três salários mínimos. Pode uma coisa dessas?
É uma discussão no trânsito, um esbarrão, uma transação comercial mal sucedida, um bate-boca entre vizinhos, a perda de uma mulher para o outro, preconceito e, etc... A tolerância das pessoas está em seu limiar, pois que, parecemos sempre aptos a mostrar aos outros, que somos muito mais “machos” que eles.
Os códigos penais vigentes, elaborados, direcionados e congregados a protegerem os privilegiados pelo poder, em suas mais diversas instâncias, mostram-se absolutamente ineficazes a coibirem os excessos. Os maus e mercenários advogados a cada dia mais habilidosos, e usando com mais eficácia as brechas e omissões existentes nas leis, a fim, de livrarem da justiça todos aqueles, que possam lhes pagar os melhores honorários, independente, de sua culpabilidade, são os mais enfáticos incentivadores da irresponsabilidade e tácito avanço da violência.
Assim como também, as instituições públicas, de maneira especial o aparelho policial, e o poder judiciário representados por suas chamadas “bandas podres”, cada vez mais corrompidas e corruptoras.
Felizmente e providencialmente, os engenhos de corregedorias das polícias e da justiça estão cada dia, mais zelosos, atentos, atuantes e menos corporativos, contra essas minorias de maus serventuários de seus respectivos quadros.
Em resumo, não há ainda nesse nosso país, sempre tão saqueado e aviltado por seus colonizadores antigos e modernos, um sentimento de moralidade e de direitos individuais da pessoa, daí essa anarquia pluralizada e consubstanciada, muito bem retratada naquela frase do ex-jogador de futebol Gérson, em um comercial de TV bastante antigo: “Eu gosto de levar vantagem em tudo.”
Hoje em dia, já não existem “malandros”, pois o crime organizado - onarcotráfico, principalmente - tomou conta de todo o espaço da marginalidade, apelidada por raia pequena. A navalha e o calibre 38 usados pela malandragem antiga saíram de cena. Atualmente, são os fuzis, as metralhadoras, granadas e as pistolas automáticas, que imperam nesse atual império do medo. Eles matam qualquer um: Dos seus colaboradores e adversários aos comuns, não livram a cara nem mesmo das autoridades constituídas.
Seriam eles corajosos... Destemidos?
Qual nada. Simplesmente, quando partem para suas empreitadas delituosas, esses desalmados já vão totalmente “cheirados” (drogados), e com isso, insensibilizados a qualquer sentimento de bom senso ou censura. Corajosos e destemidos são os policiais, que encaram esses facínoras de cara limpa e geralmente no território deles. Bandido só dá uma de corajoso e troca tiro com a polícia quando está de cabeça feita, se tiverem careta não resistem à investida policial e quase sempre são presos em baixo das camas (mijados e cagados).
Fundamentado no exposto em tela, o cidadão comum e pacífico se arma para se sentir mais seguro, e aí passa ele a engrossar as fileiras dos chamados machões, se tornando em verdade, apenas mais um agente de insegurança para o todo social.
Eu particularmente, já fui um desses covardes que para se sentir mais homem precisava estar armado. Por longos anos eu trabalhei como Segurança Particular e Agente de Disciplina de Estabelecimentos Penais de Reclusão, sendo, que com isso, assimilei que a arma de fogo para mim, era apenas uma ferramenta de trabalho, porém, mesmo fora do trabalho eu a mantinha sempre comigo em fúnebre parceria.
O negócio era tão latente, digo, essa execrável dependência e falsa segurança propiciada pela arma, que eu não conseguia ir à padaria a 100 metros de minha casa sem colocar uma 45 na cintura.
Em 1995, eu conheci um Ser muito legal e Ele começou a tocar o meu coração, através da Doutrina Espírita Cristã (também chamada por Kardecismo), e a partir daí, eu comecei a me desmascarar e a vislumbrar em mim, o estupendo bobalhão e covarde que eu sempre fora.
Com apenas algumas semanas em contato com o Evangelho de Amor do Cristo de Deus, e iniciando a tarefa de me amansar (reformar), decidi não mais me manter cativo ao medo e ao acobardamento... Fui até o terreno nos fundos de minha casa e lá cavei uma “sepultura” estreita e bem funda, depositando na mesma as duas pistolas, que eu possuía, ficando com o prejuízo do dinheiro gasto para adquiri-las, mas com a paz de que elas nunca mais iriam ameaçar ou destruir um semelhante meu.
Variadas vezes nos dias posteriores a esse “funeral dos despojos de meu medo e inconsequência”, voltava ao local daquela catacumba e com um regador pulverizava água em abundância sobre a mesma, para que o desgaste dos tais “engenhos do desatino” fosse o mais precipitado possível. Naquela época o estado não pagava (remunerava) para desarmar o cidadão.
O trabalho (profissão) que eu exercia, continuava a me obrigar ao contato com as armas, entretanto, a partir daí, somente com as armas de serviço e no desempenho deste. No ano 2000 quando eu me livrei de tais funções profissionais, a Filosofia e a Poesia, começaram a se achegar até a mim.
Resumindo, e baseado em mim, corroboro: Quem anda armado, não tem munição de fé... É muito difícil se manter ovelha, quando se vive num mundo, onde o homem insiste em ser lobo do próprio homem... Mas, com fé em Deus se consegue.
Em verdade, e definitivamente, o que nos falta e sempre faltou aos nossos antepassados, é o sentimento de Deus em nossos corações, e coragem, muita coragem, para não possuir uma arma, e com isso, se transformar em um forte aliado da fraqueza e do litígio. Por fim, o que nos falta também e, sobretudo, é a brandura e a candura das mulheres.
Entre ser um valentão armado e sair por aí dando tiro e porrada nos outros como no passado, ou ser apontado como uma mulherzinha, opto hoje, pelo segundo rótulo... Aliás, alguém viu por aí a minha sainha?
Antônio Poeta